Revista ComputerWorld, 27 de Outubro de 1997

 

O emprego na sociedade da informação

 

Artigo: Fabio Silva e Fernando Dolabela

 

A armazenagem e a transmissão da informação e a sua transformação em conhecimento, cultura e arte formam a base de uma revolução econômica e social cujos efeitos, no final do século XX, já são mais profundos que os da Revolução Industrial. Na base deste fenômeno estão a globalização da produção, o comércio eletrônico, as tecnologias da informação e a mudança na natureza do emprego. Estes quatro fatores, conjugados ao surgimento de grandes mercados emergentes, formam os pilares da Sociedade da Informação.

As mudanças na natureza do emprego se processam em duas dimensões. Primeiro, da indústria para o setor de serviços. Segundo, dos permanentes para os temporários, sem "carteira assinada" e, frequentemente, com mais de um empregador. Estamos diante de uma revolução nessa área. E os profissionais de todos os campos precisam estar aptos para terem sucesso nesse cenário. Isto é ainda mais verdadeiro na informática, devido às mudanças aceleradas de paradigma tecnológico. A Sociedade da Informação não admitirá empregados. Ela necessita de empreendedores.

É papel da universidade antecipar as tendências de mercado e revolucionar a formação do seus alunos para que estes possam transformar a realidade existente em função das necessidades do futuro. A universidade precisa, ela própria, ser empreendedora e disseminar esta filosofia amplamente pela sociedade.

 

Formação de empreendedores

Entre as principais condições para a existência de profissionais de sucesso na Sociedade da Informação, o Brasil já conquistou a principal: existência de centros de excelência na formação de recursos humanos em tecnologia da informação espalhados pelo país. De fato, uma grande parcela dos profissionais brasileiros formados pelos cursos universitários de computação e informática tem uma formação técnica equivalente à de países do Primeiro Mundo.

O surgimento destes centros de excelência teve participação fundamental do governo federal, através da Secretaria de Política de Informática e Automação do Ministério da Ciência e Tecnologia, que implementou e coordena a execução dos Programas Prioritários em Informática. É através destes programas — RNP, Softex e ProTeM-CC —, que a formação de capital humano, pesquisa e desenvolvimento em informática no Brasil atingiu os padrões de qualidade mundial.

Para complementar o ensino técnico de excelência e contribuir para uma mudança paradigmática e necessária no perfil dos profissionais de nível superior, a universidade precisa introduzir o empreendedorismo como disciplina básica de formação dos seus alunos. Foi com esta visão que o Programa Softex criou a disciplina "Formação de Empreendedores em Informática", que vem sendo ministrada nas universidades brasileiras desde 1993. Esta disciplina é parte do curriculo de referência da SBC.

A introdução de disciplinas de criação de empresas no ensino universitário tem um caráter revolucionário. Acrescendo o empreendedorismo à vocação tradicional de formação de empregados e acadêmicos, a universidade se adequa às relações trabalhistas decorrentes da reestruturação da economia mundial neste final de século.

Pesquisas em sala de aula demonstraram, surpreendentemente, que os alunos consideram a disciplina "Formação de Empreendedores" da Softex fundamental mesmo para aqueles que não pretendem abrir empresas. Levantamentos feitos junto a empreendedores apontam que o conhecimento puramente tecnológico na área de software pode representar algo entre 5 e 15% dos problemas a serem enfrentados na criação, desenvolvimento e venda de um produto.

Estes resultados conduzem a reflexões sobre os programas curriculares na área de informática, com pelo menos duas conclusões. Primeiro, a amplitude e a velocidade das mudanças tecnológicas requerem um profissional capaz de aprender continuamente. Para isto, é necessário que a sua formação tenha uma forte base em teorias e métodos tornando-o apto a compreender e antecipar as mudanças da tecnologia. Segundo, a formação técnica deve ser complementada, inevitavelmente, por uma sólida base de empreendedorismo.

A formação de empreendedores dá prioridade ao comportamento (o ser) em relação ao saber como um fim em si mesmo. Desta forma, o objetivo final não é instrumental. A proposta não é a transmissão de conhecimentos, mas o esforço no desenvolvimento de características pessoais necessárias ao empreendedor de sucesso.

Não se visa, exclusivamente, criação de empresas de sucesso, mas sim a formação de empreendedores. Para este último, o eventual fracasso da empresa é visto antes como um resultado, com o qual saberá aprender. A atividade de empreender, representada principalmente pela identificação e aproveitamento constante das oportunidades, faz parte da rotina do empreendedor.

 

Os resultados

A disciplina "Formação de Empreendedores" é ministrada em mais de 60 cursos superiores de informática das principais universidades do país e mais de 1100 alunos já passaram por ela. Destes, estima-se que perto de 300 decidiram montar o seu próprio negócio ao final do curso, estimulados pela participação na disciplina. Estas ações são coordenadas nacionalmente pelos projetos SoftStart e Genesis da Softex.

Esta é uma mudança paradigmática na formação acadêmica clássica, a qual é voltada a produzir exclusivamente empregados e cientistas. A formação de empreendedores complementa o ensino tradicional, ampliando as possibilidades de sucesso do profissional.

 

Fabio Silva, PhD, é professor Adjunto do Departamento de Informática da UFPE, diretor financeiro do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife, diretor Financeiro da Sociedade Brasileira de Computação e coordenador Nacional do Projeto Genesis da Softex.

 

Fernando Dolabela, MSc, é professor Colaborador do Departamento de Ciência da Computação da UFMG e coordenador do Projeto SoftStart da Sociedade Softex.