A Graduação em Tecnologias de Informação

Ana Carolina Salgado
Departamento de Informática, UFPE, Recife


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Introdução

Nossa área é relativamente nova e por isso discutimos ainda 'o que' ela realmente representa. Desde que os primeiros cursos de graduação se estabeleceram no Brasil, existem principalmente duas nomenclaturas: Informática (seguindo os europeus) e Ciência da Computação (seguindo os norte-americanos) [KOWA96]. Neste texto, de forma mais abrangente, nos referimos a Ciências e Tecnologias da Informação.

Para melhor analizarmos a área de Ciências e Tecnologias da Informação, poderíamos dar ênfase a três sub-áreas ou segmentos: Sistemas de Informação, Ciência da Computação e Engenharia da Computação. Esta classificação está bastante associada ao perfil do profissional que se quer formar.

A maioria dos cursos de graduação na década de 70 (ou antes) tinha uma grade curricular voltada para a área de Sistemas de Informação, com ênfase em processamento de dados. Estes cursos formavam profissionais com pouco embasamento teórico e uma grande formação em programação e análise e projeto de sistemas, e no corpo docente encontrávamos um número razoável de profissionais do mercado de trabalho, ensinando mais experiências que conhecimentos. Os egressos atuavam no mercado principalmente em desenvolvimento de sistemas de aplicação em grandes empresas.

Com a formação em massa de doutores nesta área, os perfis curriculares foram evoluindo e se voltando mais para a Ciência da Computação. Os cursos passaram a ter um maior embasamento teórico (sob protesto dos alunos, que reclamavam um distanciamento do mercado) e a oferecer disciplinas da engenharia eletrônica associadas ao hardware dos computadores. Estes cursos, alguns deles chamados Engenharia da Computação, formam profissionais diferenciados por seu conhecimento abrangente nos diversos segmentos que formam a Ciência da Computação. Estes profissionais passaram a atuar no mercado como líderes nas empresas de processamento de dados ou a investir na criação de suas próprias empresas, muitas delas de desenvolvimento de sistemas e consultoria.

Com o incentivo do governo ao desenvolvimento de software de qualidade, através do programa SoftEx-2000, os egressos dos cursos de graduação têm exercido a função de engenheiros de software, desenvolvendo software para competir a nível internacional.

No que segue deste texto, discutimos as disciplinas que compõem cada um dos segmentos identificados na àrea de computação e apresentamos o que deve ser considerado na elaboração de um perfil curricular para cursos de área. Fazemos então uma breve apresentação de como são os cursos a nível de graduação nos EUA e na Europa e tecemos algumas considerações sobre as tendências no Brasil.

Segmentos da Computação

Entendemos que existe um núcleo comum de conhecimento da área de computação necessário a todos que querem investir na mesma. As disciplinas deste núcleo são obrigatórias para todos os alunos de Computação: disciplinas básicas de matemática e física, álgebra e lógica aplicadas à computação, algoritmos e estruturas de dados, paradigmas de linguagens de programação, métodos formais, teoria da computação, compiladores, sistemas operacionais e circuitos digitais.

Além deste núcleo básico, podemos identificar disciplinas associadas aos três segmentos da computação: Sistemas de Informação, Ciência da Computação ou Engenharia da Computação, que tratamos em detalhes nesta seção.

Sistemas de Informação

Este é o segmento dedicado ao tratamento da informação desde a análise dos requisitos seguindo por todas as etapas do ciclo de vida de desenvolvimento de sistemas. Estão incluídas neste segmento as disciplinas que tratam de análise e especificação de requisitos, métodos de projeto de sistemas, engenharia de software, banco de dados e administração de projetos de sistemas.

Os alunos formados por este segmento do curso estão preparados para atuar no desenvolvimento de software de qualidade e são os mais motivados a investir na criação de suas próprias empresas.

Ciência da Computação

É o segmento que estuda os fundamentos teóricos da computação, desde as disciplinas básicas mencionadas, tais como algoritmos e teoria da computação, até teoria dos grafos, teoria dos modelos, teoria da prova, entre outras. Estão também incluídas neste segmento as disciplinas de Inteligência Artificial (IA), como por exemplo: IA simbólica, redes neurais, processamento de linguagem natural, processamento do conhecimento.

Os alunos que seguem por este segmento têm um perfil mais acadêmico e normalmente, ao concluírem a graduação, procuram um programa de pós-graduação.

Engenharia de Computação

Esta área é voltada para o estudo do hardware dos computadores, envolve as disciplinas de {\it sistemas de computação} como arquitetura e organização de computadores, redes de computadores, prototipação de circuitos integrados, VLSI, entre outras.

Os que seguem esta área são os naturais engenheiros da computação que têm campo de trabalho tanto no mercado, na área de suporte computacional, quanto na carreira acadêmica.

Perfil Curricular

Uma das características da área de computação é a velocidade das mudan\c cas tecnológicas, tornando-se imperativa uma atualização freqüente da grade curricular dos cursos desta área. As entidades de classe têm trabalhado no sentido de propor currículos de referência para elaboração de perfis curriculares, dos quais podemos citar as recomendações do Currículo de Referência proposto pela Comissão de Assuntos de Ensino da SBC[SBC91] e do currículo proposto pela ACM/IEEE-CS Joint Curriculum Task Force[ACM89,ACM91].

Um bom perfil curricular tem por objetivo permitir a formação de recursos humanos altamente qualificados, na aplicação, projeto e construção de máquinas programáveis e software com vistas a viabilizar ou aumentar a produtividade e a qualidade desses tipos de procedimentos.

Para desenvolver a capacidade de projetar e construir software e hardware de forma científica, o curso deve oferecer ao aluno uma sólida formação básica, envolvendo matemática, física, lógica e teoria da computação. Esta base sólida é responsável por duas características resultantes: pela forte capacidade de adaptação e mobilidade dos profissionais quando submetidos às mais diversas situações na vida profissional; e pelo diferencial na capacidade de projetar soluções eficientes e economicamente viáveis, garantindo o sucesso das soluções a serem construídas, em lugar de fazer experimentos não fundamentados na busca de soluções.

Um elenco de disciplinas eletivas pode oferecer ao aluno opções de disciplinas que o permita dar ênfase à sua formação nas sub-áreas citadas.

Nossa área tem uma grande característica multidisciplinar uma vez que somos muitas vezes requisitados a conhecer outros domínios de aplicação. Citamos como exemplo alguém que trabalhe na área de interfaces homem-máquina necessita conhecimentos de psicologia cognitiva, design, sociologia, entre outros. Um grade curricular de cursos de computação deve oferecer ao aluno a

possibilidade de cursar algumas disciplinas eletivas em outras áreas de conhecimento.

A Comissão de Assuntos de Ensino da SBC está propondo um novo Currículo de Referência para cursos de computação/informática. Esta proposta, apresentada em anexo, será discutida durante o IV WEI, evento do XVI congresso da SBC.

A Realidade Mundial

Procurando olhar o que está sendo implementado como curso a nível de graduação no exterior, identificamos dois perfis de curso: os que são oferecidos em departamentos de engenharia (maioria nos EUA) e os que funcionam nos próprios departamentos de computação (maioria na europa).

Graduação no EUA

Vejamos alguns exemplos de cursos de graduação nos EUA:


Deste exemplos podemos identificar que, na maioria dos casos, os bacharelados da área nos EUA são oferecidos em departamentos de engenharia elétrica ou eletrônica. é dada uma grande ênfase nos cursos de graduação oferecidos nos EUA na área tecnológica .

Graduação na Europa

Os cursos de graduação na Europa têm características bem diferentes dos cursos nos EUA. Na grande maioria eles não funcionam em departamentos de engenharia, normalmente são departamentos independentes, e a área é chamada de Informática (como na França e Alemanha).

Na França, por exemplo, os departamentos de informática normalmente são oriundos de departamentos de matemática. No sistema francês, o aluno pode ter o grau de bacharel após quatro anos de curso universitário mas é oferecido um quinto ano opcional, fazendo assim a distinção do perfil do profissional, aonde ele pode:

Uma outra opção a nível de bacharelado na França são os cursos de MIAGE (Méthodes Informatiques Appliquées à la Gestion des Entreprises), cujo objetivo é a formação de profissionais especializados na concepção e realização de sistemas de informação.

Tendências no Brasil

Encontramos atualmente no Brasil uma grande proliferação de cursos na área de Ciência e Tecnologia da Informação. Estes cursos se classificam principalmente em: Bacharelado em Ciência da Computação ou Bacharelado em Informática, cursos de Engenharia da Computação, cursos de Tecnólogos em Processamento de Dados e outros. Não há, no entanto, uma distinção muito clara entre alguns cursos de Bacharelados em Ciência da Computação e cursos de Engenharia da Computação oferecidos por universidades brasileiras.

Com relação à Engenharia da Computação muito tem se discutido atualmente, inclusive pelas comissões de especialistas do MEC, se estes cursos não seriam parte da área de engenharia, uma vez que se denominam como tal. Este é com certeza um tópico de grande interesse e que será certamente discutido durante o IV WEI.

Uma outra tendência da atualidade é o incentivo ao desenvolvimento de uma cultura junto aos alunos de graduação e pós-graduação de investimento no mercado de software competitivo a nível internacional. Os indicativos do governo apoiando projetos como o SoftEx-2000 e o Genesis, estão levando os departamentos de informática/computação do país à criação de incubadoras de empresas e os próprios alunos de graduação à criação da chamada Empresa Junior.

Neste sentido, já há um direcionamento dos cursos de computação na implantação de uma disciplina de Formação de Empreendedores nas grades curriculares, no sentido de mostrar o caminho àqueles que querem criar suas próprias empresas.

Bibliografia

[ACM89] P.J.Denning et al, `Computing as a Discipline'', ACM Communication, Vol.32, No.1, 1989.

[ACM91] ``A summary of the ACM/IEEE-CS Joint Curriculum Task Force Report - Computing Curricula 1991'', ACM Communication, Vol.34, No.6, 1991.

[SBC91] D. Nunes, R. Bigonha, T. Costa, V. Setzer, ``Proposta de Currículos de Referência para Cursos de Graduação Plena em Computa\c{c}ão'', Comissão de Ensino da SBC, 1991.

[KOWA96] T. Kowaltowski, ``Caracterização de Atividades de Computação'', Relatório II/Unicamp, 1996.

Apêndice

por Roberto da Silva Bigonha (UFMG) Daltro José Nunes (UFRGS) Ana Carolina Salgado (UFPE) Miguel Jonathan (UFRJ) Clarindo I. P. da Silva e Pádua (UFMG) Therezinha Souza da Costa (PUC-Rio)